Seleta do Acervo - parte 1

Seleta do Acervo - parte 1

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Mensagem do amigo António



Olá, Márcia.

Muito obrigado pelas lembranças do nosso saudoso Ildásio. Também eu lhe envio uma fota com o nosso amigo. Foi tirada em Lisboa, na Livraria Pó dos Livros, na tarde de 16 de Maio de 2009, dia em que (nessa mesma livraria) apresentei o livro "As Flores do Caos".
Na foto estão (da esquerda para a direita) Maria do Sameiro Barroso, Victor Oliveira Mateus, Luís Graça, António José Queiroz e Ildásio Tavares.

Abraços do
António José Queiroz

A FELICIDADE QUE TIVE NA VIDA (por Ildazio Júnior)

Fui bem nascido! Tive berço! Essas palavras poderiam até soar pedantes e arrogantes se não fossem para ilustrar o reconhecimento pelo norte, pela minha fonte e nascente chamada Ildazio Marques Tavares.

Ele nunca nos deu presentes materiais e quando os deu, sempre foram comédias, como o famoso caso das raquetes de tênis: onde ainda garotos doidos por jogar tênis e sem material legal no Brasil, ele de viagem marcada para Europa e devidamente feita sua encomenda, nos trouxe raquetes de tênis de mesa para nosso desespero e curtição de todos nossos colegas! A justificativa: Preferia carregar livros durante a viagem para nós do que, “porra de raquetes”! Ah, li as obras completas de Monteiro Lobato aos 10 anos! Machado de Assis, Gonçalves Dias, Jorge Amado, Os irmãos Grimm, fábulas de esopo e La Fontaine na adolescência, falei e pensei em inglês com 12, entre tantos outros, estes sim, grandes presentes!

Como esquecer a minha primeira suspensão no Antônio Vieira! Quinta série e um colega me disse no ônibus escolar que meu pai iria morrer de fome, pois era poeta! Nem discuti, parti para cima dele!Nesse mesmo dia o perguntei: “Pai, o que era ser intelectual?” Ele me disse, que era estudar, ler e acima de tudo ter o saber como a principal arma, o saber nos daria tudo! Mas e a grana? “Eu ia morrer de fome?” Ele riu e disse Tavares Jr., o saber lhe conduzirá a felicidade, mas você tem que ser competente!

Amante das artes e da cultura, um dos grandes artistas da maior geração que até hoje existiu na Bahia meu pai fez a minha infância e adolescência repletas de convívios para lá de maravilhosos! Jorge Amado, Carybé, Sante Scaldaferri, Carlos Bastos, Mário Cravo Filho e Neto, Antonio Carlos & Jocafi, Vinícius de Moraes, Raulzito e seus Panteras, Gil, Baden, Maria Creuza, Jair Rodrigues, Mãe Stella, Mãe Meninnha, Dom Thomaz Morton, João Ubaldo, Batatinha, Julio Medaglia, Belchior, Alcione, Paulinho da Viola, passaria uma dia citando!

Diversos cochilos nas poltronas dos teatros tentando entender quem eram Ibsen, Beckett, Camões, Pessoa, Goethe! Horas explicando uma poesia de Baudelaire e agente querendo se picar para jogar tênis e o maluco dizendo que agente não tinha jeito mesmo!

Desvendou-nos o candomblé, ao qual era profundo entendedor, colaborador e respeitador, nos dando sempre a certa visão sem folclore e sim como cultura!

Como disse meu irmão Gil em seu lindo texto, cruel em seus julgamentos (com ele mesmo inclusive!), enxergava a canastrice, o engodo, o ruim de longe e dizia sem nem pestanejar, doesse a quem doesse, “ISSO É UMA MERDA!” Não fechava com a mediocridade! Ele era valente, capoeirista de bimba, Lacrau!

Fui morar com ele de novo em 2000 e encontrei um Ildazio Tavares puto com uma Bahia que não crescia culturalmente, e segundo ele, tinha se desligado da “Bahia de merda”, se concentrava “na Bahia que restava!” Era muito mais reconhecido no Brasil e Mundo afora do por aqui! Mas ele já estava cagando a aquela altura pois sabia das suas referências e capacidades!

Como foram bons esses quase três anos! Quanto aprendizado! Quanta informação! Todo dia ia dormir ouvindo meu pai me contar histórias! A diáspora judia, a queda de Constantinopla, a mulher do General Potifar que de tanto desejar José e não ser correspondida o delatou como estrupador o fazendo ser preso, gerando a ira de Deus que jogou as pragas sobre o Egito, da deusa Circe que transformava os náufragos que chegavam a sua ilha em porcos por que todos se apaixonavam e faziam suas vontades, da música popular brasileira e seus festivais, enfim tudo para ele era motivo de uma aula!

Hoje com muita dor e sem sua direção artística, mas com sua energia sigo meu caminho carregando o nome dele! Agora é viver para honrar!
Que felicidade eu tive na minha vida!
JR.

Nossas caixas de guardados

Há alguns meses iniciamos o desenvolvimento deste blog. Como Ildásio era um tanto confuso com as questões eletrônicas, acabou perdendo a senha e o email do direcionamento dos comentários. Somente ontem consegui recuperar todos os dados para dar andamento ao nosso projeto de transformar o jornal impresso Correio da Poesia em jornal eletrônico. Com a sua partida, deixo que a natureza dê a este blog o tempo necessário para que se construa na medida da própria existência.

Ao longo dos últimos anos de convivência, fomos guardando poemas, fotografias, livros inéditos e recordações que considero de fundamental importância para a cultura baiana. São duas caixas cheias. Postarei aqui, somente as coisas que merecem deixar a caixa de guardados A, porque na B a gente só guardava o que considerávamos impublicável. "Nesta caixa (B) a gente guarda o que é pra ser epigramado, pra gente dar risada!", dizia.

Engraçado é que remexendo tudo, descobri em uma das caixas a senha que me deu acesso a este Correio da Poesia. Estava lá. No cantinho da caixa B.

Meu pai subiu no telhado, por Gil Vicente

Meu pai subiu no telhado. Sim, isso é uma paródia da famosa piada de português, povo que ele amava e que publicou seu último livro em vida. E parodio a piada porque a coisa que meu pai mais gostava no mundo era fazer piada e sei que ele riria muito (deve estar rindo, talvez) de um artigo sobre seu falecimento iniciado assim.

Meu pai subiu num telhado, mas num telhado bem alto de um palácio, de um zigurate, de uma sinagoga, de um barracão. Ele subiu em todos esses telhados e tantos outros da vasta cultura de um homem especial, talvez o único próximo a mim cujo título de gênio coubesse como a nenhum outro.
Ildásio Tavares nunca esteve nos holofotes como alguns de sua geração. Mas iluminou a cultura brasileira.

Se eu fosse desfilar o currículo de meu pai, precisaria escrever uns dez artigos. Livros, jornais, revistas, TV e google dão conta do recado. Entrementes, falar um pouco do quanto meu pai iluminou minha vida talvez seja uma metonímia do homem que ele tentou ser e em muitos momentos foi pro mundo.

Desde pequeno, bastava eu aparecer entusiasmado com alguma música, algum escritor, que ele logo me mostrava os defeitos. Foi um crítico feroz de todas as obras, a começar pela minha e, principalmente, pela dele. Como todo grande intelectual, via os defeitos e rachaduras, as falhas e fraquezas que o senso comum aplaudia e ignorava. E sofreu muito por isso. A grandeza oprime e a verdade dói. E era um grande que defendia verdades. Nem sempre as verdades, mas as suas verdades, e era muito íntegro com elas.

Dificilmente temos o que merecemos. Muitos são louvados em demasia, outros sofrem pela escassez de reconhecimento. Mas meu pai foi um lutador e um vencedor porque, a despeito da mediocridade opressora que tentava lhe anular, ele conseguiu galgar degraus que, se não o levaram ao merecido altar de gênio que era, ao menos lhe trouxeram momentos de alegria, como ao desfilar homenageado pela Nenê da Vila Matilde, em São Paulo, ou na comemoração de seus 70 anos, com momentos lindos como o de Gerônimo e Vevé cantando É d’Oxum em francês, na versão dele, ou o belo discurso de Jorge Portugal na entrega da Medalha Zumbi dos Palmares, etc, etc...

Tive o prazer de cochilar a manhã inteira no colégio depois de virar a noite vendo meu pai compor com Baden Powell. Tive a honra de, já exaurido, ter um poema em redondilha todo refeito ao lado dele quando eu tinha 7 anos de idade. Aprendi a fazer poesia, a reconhecer a beleza de muita coisa no mundo graças a meu pai. E o que levamos da vida é a beleza das coisas, a poesia dos momentos, das palavras, das cores e melodias.

Meu pai subiu num telhado, mas diferentemente da piada, ele não morreu. Ele está ali, em cima do telhado, olhando pra mim e pro mundo com olhos críticos. Eu sei que ele está lá olhando e pensando o quanto o mundo perdeu ao não reconhecer sua poesia e seu pensamento, e, nós poucos, de cá, pensando o quanto parte do mundo e eu ganhamos ao reconhecer sua poesia e seu pensamento.

Alguns poucos olharão pro telhado, em busca de meu pai. Ele vai estar lá, como todo mestre. Pois um mestre só se torna mestre mesmo quando o que ele pode oferecer deixa de ser ele e passa a ser a gente. E meu pai está mais em mim do que em qualquer outro momento esteve.

Agora é o momento de começar a aprender quem eu sou. Aos poucos, por toda vida. Tentando buscar em mim a poesia e sabedoria do pai e do mestre. A tristeza aparece no momento em que não olhamos as coisas belas.

E não tem nada mais lindo, agora, do que ver meu pai de cima do telhado, olhando pra mim e torcendo pra eu seja um grande homem. Para que eu não deixe que a pobreza do mundo invada nossa alma.

Foi isso que ele me ensinou. E será isso que eu tentarei fazer minha vida inteira, porque agora a responsabilidade aumentou; meu pai subiu no telhado e estará de lá, olhando pra mim, e dizendo; “agora é com você. Já fiz minha parte e fiz muito bem”.

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Micro entrevista com Ildásio Tavares

Fonte:  http://sopadepoesia.blogspot.com/2009/12/micro-entrevista-com-ildasio-tavares.html

2 poemas inéditos do poeta de Itapuã

GF – Na lírica moderna o poeta passou a cantar a própria poesia em oposição à realidade opressora do nosso tempo. Como você analisa tal fato?
IT
– Sempre foi assim. Contudo, em nossa época, o poeta sofre uma crise tão forte de identidade ante um sistema esmagador que, às vezes, cantar sabe a um grito no escuro.

GF – E o que, na sua ótica, justifica esse grito?
IT
– A total necessidade de expressão do indivíduo amordaçado pelo sistema.

GF – Você já afirmou que acha mais difícil criar um poema com versos livres que um poema dentro da métrica, por quê?
IT
– Por que a métrica te dá um parâmetro, uma referência fixa, um modelo estrutural para você preencher. Para o verso livre, você tem que criar este modelo estrutural. Enquanto para um você tem uma métrica geral pré-estabelecida para o outro você tem que criar uma métrica particular para cada poema. Muitos poetas quebram a cara aí porque pensam que o verso livre é anárquico ou prosaico. Não, você pode fazer arte do caos, mas não fazer caos da arte. O verso é livre, não caótico ou frouxo.

Dois poemas inéditos do autor
As anotações que o poeta faz abaixo de cada um dos seus poemas marcam a data em que o mesmo foi concebido, o local e a quantidade de vezes que sofreu interferência.

Canção da Menina na Avenida

De pé, nos tristes passeios,
noite fria na avenida,
espera mas não espera,
andando ao rastro da luz.

Há de vir, pelo silêncio,
uma oferenda do acaso,
deslindando a escuridão,
prêmio da perseverança.

Quieta, a menina fenece
na frieza da calçada.
Enquanto espera, apascenta
sua veloz esperança.




Canção de mar e vento
pra Kabá e pra Infraero

Ela caminha na praia
e nada traz sobre a pele
que um vestido transparente
sobre a nudez de escultura

O vento venta o vestido
que cola ao corpo e arredonda;
denunciando-lhe as formas,
seus abismos, suas ondas.

Quero-me amarrar no mastro
do meu saveiro, depressa,
antes que o canto comece
e não possa resistir.

Serenai, meus verdes mares
ao embalo do meu canto.
Petrificai-me, Ó meus olhos,
pelo que vejo e não vejo.

LITERATURA COMENTADA - JEQUIÉ (31/08/2009)

Fonte: http://www.souzaandrade.com.br/blog08/?m=200808

Sucesso absoluto a estréia do projeto Literatura Comentada, com o escritor Ildásio Tavares. Foi neste sábado, no Museu de Jequié. O evento, organizado por André Bonfim e Lucas Ribeiro, foi rico em conteúdo e teve uma platéia seleta. Uma excelente oportunidade de o jequieense manter um contato direto com importantes nomes da nossa literatura. Bela iniciativa.


 Na foto abaixo, Ildásio Tavares aparece ladeado dos organizadores do encontro, André e Lucas. À esquerda, o presidente da Academia de Letras de Jequié, Leonan Oliveira. A cobertura fotográfica ficou por conta do site Jequié Notícias.




Actio fructus

O que importa a um poema é escrevê-lo —
publicá-lo é perdê-lo — permitir
que os imbecis o pastem, qual  pérolas
ruminadas por suínos; ou que os ignorantes
críticos dos jornais detratem-no, mesmo quando
falam bem dele. E que os da Universidade torturem-no,
cozendo-o no tempero insosso da estupidez
científica, proferindo asneiras de muito maior
credibilidade. Quando escrevo um
poema, apenas o escrevo, sem cogitar
se vai ser bom ou se vai agradar a alguém.
Acaso o abacateiro preocupa-se com a
qualidade dos seus frutos, uns mais doces,
outros menos, uns maduros, outros não? Se
eu for poeta, darei poesia como o abacateiro
dá abacates. Se algum dia, atraído por meus
frutos, alguém quiser deles provar, que faça
bom proveito — goste ou não goste, a árvore
continuará a produzi-los, casca, polpa, e o
caroço que até se pode plantar — e sempre haverá
goiabas, tangerinas, cajás, umbus, maçãs e as
difíceis nectarinas, para quem goste do sabor
delas. O abacateiro continuara a dar abacates
e eu meus versos, sem jamais nos preocuparmos
com o destino que terão. Todavia, se meus poemas
forem publicados, não quero estar por perto para
vê-los maltratados pelos olhos dos porcos a
mastigar minhas pérolas, frutos que nasceram
de mim, sem que eu sequer quisesse.

Plenilúnio

Na cidade amordaçada,
ladra a distância na rua
e reluz sobre a calçada
uma indiferente lua.

Não sei se é março ou setembro,
se é segunda-feira ou quinta.
Não sei se esqueço ou se lembro,
Se fale a verdade ou minta.

O sol tarda na cidade
E a lua reluz no alto,
Esparzindo claridade
Sobre o negrume do asfalto.

Intenção de outono

Queria compreender o outono,
tantos e diversos amarelos,
caindo e atapetando o chão.
Fácil é o verão,
seu espetáculo de sol sobre o azul.
E a primavera com seu ramalhete
de bromélias febris; de acácias
e de orquídeas selvagens.

Queria compreender o outono,
seus amarelos que caem;
sua intenção de aos poucos avançar
até a neve — o inverno
com seu horizonte de chumbo.

O meu tempo

Não existe hora certa, existe o meu relógio,
lembrando sempre com seu tic-tac
que há a vida
para ser vivida,
que houve a vida
que não se viveu.
Não importa que o rádio renitente ruja
são tal hora e tal minuto,
hora oficial.
Afinal.
que há de oficial em minha vida?

Somente,
quebrando a paz exata deste espaço,
levando a mim a frente, sem retorno,
a tiquetaquear meu ser-serei,
existe o meu relógio, —
pulso falso,
sensato solilóquio, lento, certo,

que canta
o canto
do tempo
que é meu.

Réstia de luz

Ainda ontem, entrei sem querer naquela
pensão barata (mas limpa e asseada )
onde nos encontrávamos felizes nos
finais de tarde. Entrei sem querer,
eu juro. Procurava uma peça de carro
numa daquelas lojas perto da estação
e quando dei por mim, estava bem na porta.
Quem havia de resistir?

Na penumbra furtiva do corredor,
o coração descarrilou ate o quarto
17 que me aguardava calado como uma
verdade eterna. Tudo igual. A cama
imaculadamente branca; um criado mudo;
duas cadeiras puídas de palhinha; e a
bacia de louça cor-de-rosa em que te
lavavas, depois, ocultando teu gesto,
constrangida, para não te banalizares —
tua aura de deusa profanada por
essa intimidade prosaica.

Quanta vez, este teu recato ante a
promiscuidade me excitou, te enlacei
por detrás e te trouxe de volta ao
tumulto da cama! Tu sempre resistias.
Você é louco, menino? Ele chega cedo
do trabalho. Olhe aquela réstia de luz
na persiana como engatinha sorrateira
a caminho da noite. Mas resistias um
resistir indeciso, querendo mesmo te
entregares, e desta vez, com mais volúpia.

É um amor bem mais amor esse amor
que me fazes depois, tu murmuraste
um dia, abaixando os olhos, com esse
teu jeito recatado e tímido de
tudo fazer e nada comentar. Foi num
desses dias em que sentimos a terra
tremer embaixo de nós e até pensamos
que era o trem.

Lá estava a réstia de
luz que engatinhava pela persiana,
prestes a engendrar a noite. Não sei
se foi ele, se fui eu ou o que foi.
Ninguém entende a lógica das mulheres.

Faz bastante tempo que nos vimos. Foi
no meio da rua, por acaso. Tu nem
quiseste sentar para tomar alguma coisa,
conversar. Era um final de tarde. Tinhas
pressa. O que a gente tem pra conversar,
conversa aqui mesmo, em pé, diga.

Eu tentei reviver em minhas trôpegas palavras
nossos momentos de esplendor; cerzir
retalhos do passado como uma colcha de
delírio. Tu ouviste calada e no final
disseste. Acabou, menino, passou, esqueça.
Com um sorriso didático e nada teu.

Com um ar preocupado, consultaste teu
relógio e foste embora, sem um adeus,
pisando nas nuvens num passo curto
e ligeiro. Eu via uma pessoa mas era
outra pessoa. No quarto imóvel da
pensão barata, a réstia de luz desenhava
preguiçosamente as horas diminutas do
final da tarde, recorrente indiferença
de todos os dias. Sinete azul da eternidade.


Nossa Senhora dos Pecados

Não a vós adoro,
Nossa Senhora dos Pecados
mas aos meus pecados.
Por eles vos tive; e neles.
Por eles vos vi em Rafael.
                         Murilo
                         Angélico
                         Tintoretto,
nos vossos braços um menino lascivo.
Nossa Senhora dos Pecados sois;
dos meus pecados sois
os meus pecados sois
      meus
       sóis.

Ode Estática

Olha, Denise, se tu fores ao passado,
anos quarenta, lá no interior,
haverás de estar comigo e contigo
naquele colóquio que jamais esqueço.
Se bem mereço, estaremos juntos no quintal.
Lembras-te da hera no muro alto
ao pé do qual brincávamos em horas preguiçosas?
Dos canteiros de dálias, chapéus de couro
e margaridas amarelas? As sombras da tarde,
obedecendo aos telhados e cornijas,
traçavam formas imprevistas no cimento —
tu mostravas a mim esses desenhos
que descrevias em contornos de intensas fantasias.
Como as nuvens redondas num céu sempre
azul de sertão. O mundo era calmo.
O tempo lento. Lembro-me do vento,
açoitando as folhas pequenas de um pé de sapoti.
Lembras-te também? Vejo tudo como numa fotografia.
Vês? Tudo arrumado como a fazer pose
para a câmara de nossos mais recônditos refluxos,
olhos sutis dó nosso sentimento
(alcançam muito mais que um telescópio).
Prefiro crer que lembres. Não sei a quantas andas,
talvez casada com o Dr. Fulano de Tal, rica, gorda,
quiçá adúltera; ou tocando piano a tarde toda
como uma santa. Não importa. Importa é que
em alguma célula de teu cérebro essas coisas
haverão de estar arquivadas e por um motivo
qualquer serão tiradas do inconsciente,
nem que eu tenha de ficar famoso e meus versos
de correr o mundo. Lembrarás então — como
eu me lembro — daquele menino tímido:
tu me dizias que eu era bonito; até acariciavas
meu cabelo mas minha timidez não se dissipava.
O primeiro dia em que nos beijamos,
escondidos atrás do tronco bojudo de uma mangueira,
foste, tu, Denise, que tomaste a iniciativa,
premindo teus lábios contra os meus,
nada mais que um leve roçar de peles curiosas.
E tanto afligiu-me a consciência de um ato pecaminoso
que Domingo na Igreja da Matriz tudo contei ao padre.
Tu deves-te recordar pois no mesmo dia, o teu recato
impediu-te de ir ao confessionário — assim disseste
a mim com um sorriso sutil — como eram os teus.
Mas nosso beijo apressado abriu caminho
a caravelas nos mares dos sentidos, descobertas
de cheiros e de gostos; de tatos e contatos; de visões.
Tudo escondido. Lembras? Do esquisito sabor
de cumplicidade e de segredo? O mundo
ignorante derrotado num simples trocar de olhos.
tua mãe na sala tricotando ingenuidade
e nós dois na sala de costura atrás das cortinas,
os corações palpitando de medo e de emoção.
Tu, mais velha do que eu um pouco,
incentivavas meus avanços nos territórios secretos,
onde se esconde um cobiçado tesouro, jóias
de nome estranho; e correspondias com carícias
que eu nunca imaginara. Mais do que eu,
tu querias tudo, todo o encanto que esse esconso
universo a nós dois ofertava. Não temias
os temores que temem as mulheres tementes.
Desejavas todos os mistérios e surpresas
que colhíamos na penumbra azulada daquela
sala de costura. O primeiro dia em que te vi sem roupa
foi tão solene que até hoje nunca digo nua.
Eu me lembro. Era segunda-feira. A tarde descambava.
Nós dois na sala de costura. Tua mãe cochilava.
Tu já beiravas os doze anos, onze tinha eu.
Não sei qual demônio de mim se apossou.
Pedi e me negaste, primeiro com pudor;
depois com esquivanças, rudezas e desdém;
nervoso, eu insisti, com rogos e com súplicas;
e pouco a pouco tu calaste, sem me responderes:
numa ousadia, da qual não suspeitava,
fui doce e vagarosamente mobilizando laços,
presilhas e botões — ela não resistiu, como
eu até esperava. Súbito fez-se o encanto — Sus — era
um fascínio; eu quis gritar, ela tapou-me a boca.
Ah, nesse dia começou uma era. Ah, nesse
dia eu descobri um mundo.
Desde os cumes pontiagudos dos teus seios,
às colinas arqueadas do teu dorso,
até as penugens macias de teu vale —
tudo banhado pelo azulado da penumbra
no ambiente lascivo da sala de costura.
Um verdadeiro quadro de Velásquez,
se Velásquez pintasse meninas nuas.
Se tu fores, pois, ao passado, minha Denise
de então, anos quarenta, do interior
que sempre falou mais alto em mim do que capital,
se tu fores lá como espero, renovas nossas juras
que já são eternas; abraça-me e me beija
detrás daquela mangueira; me leva pela mão à sala
de costura e permanece nua, cravada na distância
dos acidentes breves, dos odores doces,
na visão parada do teu corpo tenro
que é o corpo ausente em que te procuro
em todos os caminhos, pelo mundo todo,
em todas as mulheres.

O Enfado de Tereu

Me irrita a paranóia dos pássaros
quando ruflam de mim
fuga e aflição
me irrita.
Jamais ousaria caçá-los
para me deliciar
com a frágil obscenidade
de seus cadáveres
dourados ao fogo com tempero e requinte.
No passado, confesso que já consumi
dessas que se caçam perdizes. Mas foi
há muito tempo. Jamais mastigaria
um lírico colibri
Ou este bem-te-vi
que fugiu de mim agora, tão amarelo.

O Barco Bêbado

Mostrou o poema a seu amigo,
com a certeza adolescente
de que ninguém, na França,
poderia estar fazendo igual.

(E, provavelmente, estava certo)
Depois, mudou as armas; mudou
de ramo. Arranjou uma mulher.
E se acabou,
como a esfuziante flor do hibiscus
que dura um dia, murcha e cai no chão.

(Há coisas grandes demais para os dezoito anos)

The Small Wee Hours

É nas horas pequenas, mais pequenas,
começo e final de cada dia,
que mais vibrante vem a mim,
vibrando, a tua imagem,
cor de sonho, resgate
de um passado de esplendor.

Corre o dia. Cresce a luta.
Cruzam ares e mares
os petardos invisíveis
do amanhã
que se armam hoje
e hoje são despedidos.
No barulho e fumaça
da cidade assaltada
de pavor e sacrifício.

Só nas horas pequenas, mais pequenas,
é que tua imagem vibra
e me estremece.


Poema Desnatal

Será Natal também em Kabul
quando chegar o dia. Mas pouco
importa. Será Natal. A fome e a
miséria prosseguirão o seu presépio.
Não importa. Será Natal. A solidão
estará solitariamente só e solitária.
A solidão estará tudo menos solidária.
Mas será Natal.

No Brasil, em Portugal.
Na Groenlândia, na Tailândia.
Na Nigéria, na Libéria.
Na Desunião Soviética.
Na paranóia norte-americana.
Na prosperidade germânica.
Na voracidade nipônica.
No imperativo britânico.
No desterror do golfo.
E no horror supremo do lugar onde o menino nasceu —

Pipocam no ar os petardos,
rasgam céus outros cometas,
matracam metralhadoras,
balas assobiam.

E em cada milímetro do solo sagrado
explode uma bomba
em comemoração pelos mortos de Belém.

Em verdade não ficou pedra sobre pedra,
nem há de ficar. Está escrito.

Quando os peixes se dispersam pelo mar,
dificilmente nadam para trás.

A roda roda para trás e eis a hora do Aquário.
Do Espírito Santo. Ruáh. De todas as
confluências. E será sempre Natal
em todas as partes deste aprazível
planeta, mesmo naquelas em que
os meninos de Liverpool são mais conhecidos
que o menino de Nazaré.

Será Natal. Nascerá um menino.
E nele, por ele, com ele nascerão
todos os meninos que houve, há e haverá
de nascer. Nascerá um menino,
determinação segura de prosseguir.
Ninguém sabe. Nem para onde.
Nasceu, viu e venceu.

Venceu o tigre dente de sabre.
Venceu o gelo, a inundação.
O ciclone, o terremoto, o vulcão.
Venceu os ares, os mares, a noite.
Venceu o outro. Venceu até a si mesmo
(sem constância, todavia). Mas lutou
contra suas certezas, essas mesmas
certezas de que é feita sua ignorância,
seu medo. E venceu-as. Venceu o medo
quando se fez imperioso e necessário.

Veio de longe, do escuro, esse menino,
essa menina a lhe enxugar os olhos. A
lhe dizer o que ninguém sabe nem pode
dizer. A lhe dar o colo, o sexo, o útero
benfazejo, o seio farto, e a palmada
na hora certa da traquinagem errada.

Menino e menina os criou. E nascem
todos os dias em um Natal cotidiano.
Nascem, vêem e vencem.
Em mais uma etapa da aventura que
começou quando, atraído pela lua,
um ser emergiu do mar e rastejou pela praia,
atraído pela lua, périplo pelas estrelas
de meninos e meninas
a  nascer todos os dias
em ininterruptos Natais. Amém.


Normal Ode




A poesia é a loucura organizada.
Nunca apenas a loucura. Seu discurso caótico.
Seu desenho anárquico. Geografia convulsa
de ignorância e desespero. Suas lucubrações
vertiginosas sobre todos os absurdos.
Seu abraço grotesco. Sua sala de estar
ornamentada com excrescências rococós.
Seu Horror, sua Ira, seu Destempero, sua Degola.
seu tempo que se desenfreia nas cordas
febris de violoncelos desafinados.
Sua constante, surda, pertinaz, traiçoeira e laboriosa
escalada até os píncaros nevados  do Poder,
de onde excrita Onipotência,
urina fel e comanda com a mão direita
os que, em transe, os cabelos revoltos,
soltam pelos campos e mares
os Cavalos do Medo e do Terror.
Donzela sinistra que crispa nos olhos
os projetos, símbolos e instrumentos da Devastação.
Eia Loucura! Eia Insensatez! Eia todos os caminhos
que se enrijeceram para transformar a Natureza
em Desrazão quando a loucura vê a Razão
no seu espelho e imediatamente abre o Dicionário
pensando que encontrará a Poesia
como um ovo de macuco num ninho de colibri.
Falo da loucura e de seus irmãos mais gêmeos e fortes,
os Desmandos da Razão.
Nunca das afecções da mente
identificadas pelos psiquiatras
que sabem, com suas exceções, domá-las com álcoois
ou sais extremamente simples. Talvez
fale dos próprios psiquiatras, empolgados
pela possibilidade de entender o sistema límbico
quimicamente; frustrados por não poderem
contrariar o livre arbítrio
do ácido desoxi-ribo-nucleico
com a onipotência científica do século XIX
que se nutre soturnamente
da ingenuidade de Kant enquanto o rejeita.
São eles, os empertigados psiquiatras,
os que desejam à socapa que todos nós tenhamos
o fígado no cérebro,
para nos injetarem extrato hepático
que de nada adiantaria
mas pelo menos não teria efeito colateral:
Salve, salve, três vezes salve
esses aplicados Sacerdotes da Loucura,
na mão esquerda uma seringa hipodérmica;
na mão direita um tratado de Farmacologia
como se o ser humano fosse apenas
esse emaranhado físico-bio-químico que eles não
entendem ou uma simples máquina de desejar
como querem outros. Isso tudo é Loucura.
Com a Loucura se faz psiquiatria
e se vive muito bem dela.
Mas ninguém faz poesia só com a Loucura. Nem
com a Insensatez. Muito menos com a Razão
caminhando numa reta inexorável
de onde nem a desvia a Morte, como o búfalo
mesmo ferido. Nada é reto.
Opte-se pela reta e no máximo chegar-se-á a ser
um poeta concretista, assim mesmo, em caixa baixa,
para usar seus códigos contra eles
essas serpentes que criaram
e que hoje lhes mordem sem que o percebam.
A redundância, por vezes, não é defeito,
dizia um célebre publicitário alemão,
ou nunca é — convence, suaviza, refresca, revigora.
Tudo que sei dizer. Falta-me
uma boa memória para números e nomes.
E as pessoas só dão credibilidade
a quem sabe manipular números e nomes. Eu mesmo
nunca contei aquela história do filósofo Zen
que publicou um livro no Ocidente,
com o prefácio elucidativo de Jung
e deu uma entrevista nos jornais da época,
dizendo que Jung não entendia nada de Zen.
Quem entende? Eu? Eu não. Eu não entendo
outras coisas, quanto mais
de Zen Budismo. Imaginem. Logo eu
que, quando estou com fome preocupo-me
com os carboidratos justamente porque
não quero ficar bojudo
como esses monges orientais
que ficam milionários nos Estados Unidos,
pregando abstinência dos bens materiais
e de toda a carne, e suas discípulas
retribuem iniciando-os nas delícias supremas
dos chocolates suíços e do "strawberry cheese cake" ;
logo eu que, quando estou com sede bebo vinho branco
brasileiro ou chileno — amaldiçoando o bolso
porque não posso beber um Chateau Laffite,
safra 1972. Logo eu que, quando estou com
vontade de escrever um poema
tenho que dar aula de literatura numa universidade
federal que nem sabe se isso existe. Aula de literatura.
Como se alguém pudesse, em verdade, dar aula
de literatura. Nem que fosse para justificar
a existência do barroco baiano.
Mas olhem, antes que me esqueça. Nunca contei
essa história porque não consigo me lembrar do nome
do engenhoso filósofo Zen. Mas é isso mesmo.
Até Freud não explicou nada.
Jung mesmo, ele nunca entendeu e incinerou
seu pensamento à luz de preconceitos científicos
que hoje são execrados pela ciência. Como fez
com Reich que não teve para onde correr.
Morreu só, exilado em si mesmo.
Como todos os gênios. Freud nada explica.
nem sequer os que forjaram metáforas fulgurantes
em cima de suas conclusões precipitadas
quando não levianas. Quem melhor
elaborou seu pensamento e dele fez poesia,
ele simplesmente desdenhou
"desculpe, Monsieur Breton, mas nada entendo
de literatura; como o senhor não entendeu
meu conceito de Inconsciente". E agora?
Que será de milhões de palavras drapejando no papel?
Que será de milhões de telas penduradas nos olhos?
E tudo o mais? Hein? Que será?
E foi justamente esse pesquisador lotado em Viena
que tentou tapar os buracos da alma humana.
Dá pra entender? Ou é mesmo Surrealismo?
Para mim é apenas um pequeno capítulo
da novela do Absurdo. Ninguém
explica nada. Não há o que explicar. As coisas
são o que são. Convém, todavia, frisar
que sou apenas um funcionário da Literatura
e que nunca fiz mal a ninguém. Mesmo
quando belisco a pele por vezes sensível
de algum Sacerdote da Loucura.
Sempre quis fazer poesia, organizando
todo o caos que já encontrei
quando cheguei, desprevenido, a esse planeta azul
que amo como poucos; organizando assim meu caos
interior, eis o melhor que fiz da minha e da de todos
loucura, fruto de minha imaginação e ansiedade.
A flor carnívora desses versos.


Romances

Roda de fogo (Coleção Edição do Pasquim, 1980), A ninfa (Nórdica, 1993) e O domador de mulheres (Imago Editora, 2003). Em 1996, reuniu seus artigos sobre cultura afro-brasileira e publicou-os sob o título de Nossos colonizadores africanos. Possui coluna semanal no jornal Tribuna da Bahia, desde 1987. Escreveu o drama lírico Lídia de Oxum, primeira ópera afro-brasileira da Bahia, e encenou-a em 1995 em Salvador, São Paulo e Brasília; em 1996, novamente em Salvador, com direção sua.

Livro de Estréia

Somente um conto, mereceu elogios da crítica: Otto Maria Carpeaux, dando-lhe destaque, no Jornal do Brasil; e no exterior, William Meggerney, na revista Alaluz, Califórnia; Ramon Solis, no Estafeta Literário, Madri; em Portugal, Ferreira de Castro, Fernando Namora, Álvaro Salema, Urbano Tavares Rodrigues e Luiz Farjaz Trigueiros. Nelson Werneck Sodré afirma sobre sua poesia: "É fácil compreender a alta qualidade na linguagem do poeta. Em primeiro lugar, pelo domínio da arte poética na linguagem de síntese que é sua essência. E ainda pela capacidade de, nessa linguagem, praticar aquilo que Brecht ensinou: as diferentes maneiras de dizer a verdade".

Sobre o Professor Ildásio Tavares

Nota biográfica por Assis Brasil:

Ildásio Tavares pertence à geração Revista da Bahia, juntamente com Cyro de Mattos, Fernando Batinga de Mendonça, Marcos Santarrita, Alberto Silva. Estes e mais José Carlos Capinam, Ruy Espinheira Filho, Adelmo Oliveira, José de Oliveira Falcón, Carlos Falck, Maria da Conceição Paranhos entre outros "formam um panorama fecundo e variado" a partir da década de 60.

Poeta, sempre teve inclinação para línguas, tendo estudado latim, francês e inglês antes do ginásio com uma governanta suiça.

Seu primeiro poema data dos 12 anos e Ildásio Tavares publica pela primeira vez no Jornal da Bahia, em 1962, estreando em livro com Somente um canto em 1968.

Participou ativamente do Movimento Poesia Som que promovia recitais e comícios de poesia e poemas seus saem em antologias de circuito nacional e internacional. Atuando também na área de ficção e de ensaio, o poeta, como letrista, tem músicas gravadas por Maria Bethânia, Alcione, Cláudia, Vinícius e Toquinho, Nelson Gonçalves e Maria Creuza.

Tradutor e professor de inglês e literatura americana por 19 anos, Ildásio Tavares vai publicar mais três livros de poesia na década de 70: Imago, 1972, Ditado, 1974 e O Canto do Homem Cotidiano, 1977. Em 1980 publica Tapete do Tempo, em 1996 Poemas Seletos, em 1977 Livro de Salmos, 9 Sonetos da Inconfidência, e os Sonetos Portugueses pelo Pen Club de Lisboa, além de dois romances, um livro de ensaios afro-brasileiros, e em 1995 o libreto da ópera Lídia de Oxum, encenada em Salvador, São Paulo e Brasília e que será remontada pelos 450 anos da cidade. A Arte de Traduzir é um livro que mostra as experiências do poeta em várias línguas. O poeta também já teve várias peças teatrais encenadas na Bahia e no Rio.

Os melhores nomes já se expressaram sobre sua poesia. Nelson Werneck Sodré diz: "É fácil compreender a alta qualidade do poeta. Em primeiro lugar pelo domínio da arte poética na linguagem de síntese que é sua essência. E ainda pela capacidade, nessa linguagem, praticar aquilo que Brecht ensinou, as diferentes maneiras de dizer a verdade". Assis Brasil - http://www.jornaldepoesia.jor.br/il.html